Levantamento exclusivo do Greenpeace Brasil via satélite mostra que o garimpo continua abrindo novas áreas de exploração dentro de Terras Indígenas da Amazônia: entre janeiro e junho de 2024. 417 hectares de novas áreas de desmatamento associado ao garimpo foram abertas nas Terras Indígenas Kayapó, Munduruku e Yanomami.
O território mais devastado no período analisado foi a TI Kayapó, com 54,4% dos alertas; seguido da TI Yanomami, com 40,63%. A Terra Indígena Munduruku registrou 4,87% do total acumulado no semestre. Os resultados são oriundos do sistema de alertas de monitoramento Papa Alpha, utilizado pelo Greenpeace Brasil.
Até dezembro de 2023, a área devastada pelo garimpo nos territórios Kayapó, Munduruku e Yanomami totalizava mais de 26 mil hectares – isso é mais de 90% das ocorrências de garimpo dentro de territórios indígenas no Brasil. De acordo com a Constituição Federal, é ilegal garimpar nos territórios dos povos originários.
Para o porta-voz da Frente de Povos Indígenas do Greenpeace, Jorge Eduardo Dantas, apesar de forças-tarefas do governo federal nos últimos meses, os dados nas três terras indígenas analisadas mostram que há muito a ser feito no combate ao garimpo ilegal.
“Um dos grandes apelos dos povos originários é a desintrusão de seus territórios, que é a expulsão total dos garimpeiros de suas terras. Isso já foi feito na Terra Yanomami em 2023, mas os Kayapó e os Munduruku seguem aguardando quando isso vai acontecer. O garimpo destrói ecossistemas, desestabiliza populações tradicionais e ameaça nossa capacidade de combater a crise climática. Por isso, a expulsão dos garimpeiros ilegais e a defesa dos territórios indígenas precisam ser pautas defendidas por todos nós”, afirma o porta-voz do Greenpeace Brasil. De maneira geral, os alertas dentro dos territórios originários monitorados pelo Greenpeace diminuíram significativamente em comparação com os últimos anos. No entanto, pequenas áreas estão sendo abertas próximas a garimpos já estabelecidos, como uma tentativa de dificultar a detecção por imagens de satélite.
Migração
A Terra Indígena Kayapó registrou 227 hectares devastados pelo garimpo no primeiro semestre de 2024. Desde que o Greenpeace Brasil iniciou esse tipo de monitoramento, em 2022, foram registrados um total de 15.715 hectares desmatados pelo garimpo no território Kayapó. Em comparação ao mesmo período do ano passado, houve queda de 60,18% na abertura de novas áreas. Na Terra Indígena Yanomami, foram registrados 169,6 hectares destruídos no primeiro semestre de 2024. Em comparação com o mesmo período de 2023, a queda nos novos alertas foi de apenas 5,92%.
Também foi identificado no território Yanomami a migração da atividade garimpeira para a região sul da terra indígena, na porção mais próxima do Amazonas, alcançando a região adjacente ao Parque Nacional do Pico da Neblina, no município de Santa Isabel do Rio Negro. Foram mais de 90 hectares de garimpo registrados na bacia do rio Cauburi – parte é área nova -, a 5 quilômetros da aldeia Ariabu, e se estendendo por 12 quilômetros ao longo do igarapé de mesmo nome da comunidade; e outra parte é de um garimpo antigo, que foi reativado recentemente.
Novos focos
Das três terras monitoradas pelo Greenpeace, a Terra Indígena Munduruku registrou o menor número de alertas – foram 20,2 hectares abertos para a atividade garimpeira.
No Sul do Amazonas e na fronteira entre Rondônia e Mato Grosso, a devastação chama atenção e já ameaça outras áreas protegidas, como o Parque Nacional dos Campos Amazônicos e as Terras Indígenas Apurinã, Sete de Setembro e Zoró. O crescimento do garimpo nesses territórios aponta para novos focos de garimpo e novas rotas de migração da atividade criminosa.
Unindo esforços
Com o objetivo de combater o garimpo, lideranças dos povos Kayapó, Yanomami e Munduruku se uniram e formaram uma coalizão – a Aliança em Defesa dos Territórios – cujo propósito é cobrar das autoridades ações efetivas para a expulsão dos garimpeiros de suas terras. Neste mês, duas dessas lideranças estão em Genebra, na Suíça, participando da 17ª Sessão do Mecanismo de Especialistas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (EMRIP), da Organização das Nações Unidas (ONU). Dotô Takak Irê, liderança Kayapó, e Júlio Ye’kwana, da Terra Indígena Yanomami, discursaram na plenária principal do evento e também participam de eventos paralelos.
“O que acontece nas nossas terras é uma exploração em grande escala: tem máquinas pesadas nos nossos territórios, os garimpeiros estão metidos com o crime organizado e o ouro é vendido internacionalmente. É necessário que todos os países se comprometam em verificar a origem do ouro que estão comprando. Queremos que a ONU cobre o Brasil para criar leis para controlar a cadeia de comercialização do ouro e o uso das máquinas escavadeiras”, afirma a liderança indígena Dotô Kayapó, que é também é diretor presidente do Instituto Kabu, uma das maiores e mais importantes organizações de seu povo.