Citada em reportagem do Fantástico, no domingo (18), a Fazenda Nossa Senhora das Cachoeiras do Ituxi, em Lábrea (AM), foi identificada pelo Greenpeace Brasil como beneficiária de crédito rural, apesar de estar sobreposta a Unidade de Conservação, a Flona do Iquiri. O caso consta do relatório “Bancando a extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”, publicado em abril, no qual o Greenpeace revela como bancos nacionais e internacionais destinaram somente em 12 casos um total de R$ 43 milhões em crédito rural, entre 2018 e 2023, para imóveis envolvidos em diversas irregularidades na Amazônia.
No caso publicado pelo Greenpeace Brasil em abril (caso na íntegra está disponível aqui), o fazendeiro Ricardo Villares Lot Stoppe, pai de Ricardo Stoppe Júnior – personagem da reportagem do Fantástico e conhecido como “Rei do Carbono”, por negociar centenas de milhões de reais em crédito de carbono na fazenda em questão – conseguiu financiamentos via crédito rural com o Banco da Amazônia (Basa), dois em abril e um em junho de 2019.
Logo depois de obter os contratos de crédito, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) da Fazenda Nossa Senhora das Cachoeiras do Ituxi foi suspenso devido a irregularidades na propriedade: a fazenda, que tem área total de 130 mil hectares, está sobreposta à Floresta Nacional do Iquiri em 68% de seu território. Segundo a nova regra para a concessão de crédito rural, os bancos não podem financiar crédito para imóveis com sobreposição a Unidades de Conservação a partir de janeiro de 2024.
Porém, depois de ter seu CAR suspenso, Stoppe decidiu pedir um segundo cadastro para a mesma área. O registro foi feito em dezembro de 2020; em junho de 2023, seu status aparece como “Pendente”. Com esse segundo registro, o fazendeiro não teve dificuldades para obter mais empréstimos que foram concedidos pelo Banco da Amazônia, em fevereiro de 2021, para aquisição de bovinos e para compra de máquinas e equipamentos, com vencimento apenas para 2033.
Dados de movimentação de gado também mostraram que em em setembro de 2021, Stoppe comprou para engorda 500 bois da Fazenda Monte Alegre, propriedade que tem registro de área embargada, demonstrando como o dinheiro do crédito rural pode ser usado para para movimentar a cadeia de pecuária em propriedades rurais que não poderiam criar ou comercializar gado por conta do seu passivo ambiental e fundiário.
“A investigação do Greenpeace identificou que o senhor Ricardo Stoppe comprou gado de uma fazenda que tem embargo e que está dentro de uma floresta pública não destinada. Vale ressaltar que esse fazendeiro tem crédito rural para a aquisição de animais desde 2021 com vigência até 2033, concedida pelo Basa, um banco público. Esse caso mostra a importância de um maior rigor nas operações do crédito rural, para que esse dinheiro não vá para pessoas envolvidas com irregularidades socioambientais. É urgente que a instituição financeira monitore de maneira contínua e séria as áreas financiadas e que exija ou promova a rastreabilidade dos tomadores de crédito, entre outras medidas”, explica a coordenadora de Florestas do Greenpeace Brasil, Cristiane Mazzetti.
Demandas
No relatório “Bancando a Extinção: bancos e investidores como sócios no desmatamento”, o Greenpeace Brasil traz uma série de demandas às instituições financeiras, que se adotadas voluntariamente pelos bancos, podem prevenir que financiamentos como os de Ricardo Stoppe sejam concedidos.
Dentre as demandas está que os bancos devem verificar antes da concessão do crédito e periodicamente o cumprimento dos critérios socioambientais e se, constatado descumprimento, suspender a concessão e/ou liquidar antecipadamente a operação; Vedar a concessão de crédito para imóveis rurais que tenham usado fogo de maneira ilegal e solicitar a rastreabilidade da pecuária e apresenação da Autorização para Supressão de Vegetação (ASV) caso haja desmatamento após julho de 2008.